Balzac deixou a frase para a história: “A burocracia é um sistema gigantesco gerido por pigmeus ”. Seu país, a França, teve a duvidosa honra de cunhar o termo. A palavra burocracia combina o termo bureau (escritório ou mesa de trabalho, em francês) com o termo krátos (poder, regra ou governo, em grego).
Consta que a origem remonta ao ano de 1665, quando o rei Luís XIV nomeou Jean-Baptiste Colbert controlador-geral das finanças. Colbert reorganizou o comércio e a indústria e perseguiu os corruptos. Para garantir a atuação justa do governo, exigiu que os funcionários seguissem regras rígidas, aplicadas a todos. O rigor e a inflexibilidade de Colbert levaram Jean-Claude Marie Vincent, administrador do comércio, a criticar as resoluções, que considerava impeditivas para a atividade comercial. Para ilustrar a sua crítica, Vincent criou o termo bureaucratie, referindo-se, de forma pejorativa, à concepção e aplicação de regras, sem considerar as consequências práticas.
A burocracia fundamenta-se na ideia de que todas as funções são executadas por profissionais habilitados e balizadas por certos princípios: o caráter legal das normas e regulamentos, a formalização da comunicação e a divisão racional do trabalho. O sistema nasceu para ser a materialização da racionalidade. Porém, pelas mãos dos burocratas, converteu-se em um monstro que todos aprendemos a temer e a abominar.
A lista de disfunções e vícios associados à burocracia é longa. A burocracia afirma que, diante dela, todos somos iguais. No entanto, a igualdade de tratamento costuma vir acompanhada pela impessoalidade, pela negligência e pela ineficácia. A burocracia sacraliza as regras, que passam de meios a fins. Entre resolver um problema e seguir uma norma, o burocrata comumente opta por seguir a norma. Lixe-se o cidadão. A burocracia muda apenas lentamente, quando muda. O ambiente pode transformar-se radicalmente, mas a burocracia não se adapta. Tende a tornar-se anacrônica. A burocracia organiza-se como um sistema neutro e justo. Entretanto, a sua complexidade e o seu porte facilitam o nepotismo, os abusos de poder e a corrupção. O resultado é um sistema central em nossas vidas, do qual não conseguimos escapar, mas que costumamos odiar. A burocracia consegue somar a ineficiência ao poder ameaçador, a incompetência dos amanuenses lerdos à manipulação interesseira dos funcionários corruptos.
Dentro do sistema, os burocratas buscam incessantemente a “expansão geográfica e demográfica”. Quadros inchados significam mais gente a coordenar, mais serviço a controlar e mais poder a exercer. Assim, a burocracia combina negligência no serviço ao cidadão com a capacidade de inventar trabalho para si mesma. John Kenneth Galbraith registrou para a posteridade: “A tendência da burocracia é achar objetivo em qualquer atividade que se esteja fazendo”.
Na burocracia pública ou na privada, os burocratas procriam sem parar. Donald Keough, ex-CEO da Coca-Cola e autor de The Ten Commandments for Business Failure, comentou em alusão à própria multinacional: “Tendo despendido os meus primeiros anos no negócio de gado de meu pai, verifiquei que, se colocarmos a mistura certa de machos e fêmeas, acabaremos por obter muito mais animais. As burocracias multiplicam-se do mesmo modo. Eis como funcionam: põe-se um gestor em um lugar e, decorridos dezoito meses, ele tem uma assistente. A assistente torna-se um gestor júnior e o que se observa? Outra assistente. O ritmo continua”.
Nas burocracias, as regras originalmente estabelecidas para garantir clareza e eficiência deixam de ser meios e se transformam em fins. Por sua vez, os burocratas controlam o sistema como se protegessem a própria vida, pois sentem que mudanças podem reduzir seu poder ou sua autoridade. Com o tempo, os burocratas isolam-se em seus castelos, os abusos tornam-se corriqueiros e eventuais mudanças enfrentam barreiras intransponíveis.
Em Pindorama, muitas empresas e órgãos públicos mantêm padrões inaceitáveis de atendimento e de relacionamento com os cidadãos. Do Poder Judiciário às estatais, do sistema de saúde ao sistema de educação, observamos casos gritantes de desperdício de recursos e de desrespeito aos contribuintes. Todos temos histórias de horror para contar. A situação não é diferente em algumas empresas privadas. Além de vitimar os clientes e funcionários, essas organizações também vitimam a si próprias. No embate entre as forças para mudança e os interesses estabelecidos, os últimos continuam vencendo.
http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=3789
Consta que a origem remonta ao ano de 1665, quando o rei Luís XIV nomeou Jean-Baptiste Colbert controlador-geral das finanças. Colbert reorganizou o comércio e a indústria e perseguiu os corruptos. Para garantir a atuação justa do governo, exigiu que os funcionários seguissem regras rígidas, aplicadas a todos. O rigor e a inflexibilidade de Colbert levaram Jean-Claude Marie Vincent, administrador do comércio, a criticar as resoluções, que considerava impeditivas para a atividade comercial. Para ilustrar a sua crítica, Vincent criou o termo bureaucratie, referindo-se, de forma pejorativa, à concepção e aplicação de regras, sem considerar as consequências práticas.
A burocracia fundamenta-se na ideia de que todas as funções são executadas por profissionais habilitados e balizadas por certos princípios: o caráter legal das normas e regulamentos, a formalização da comunicação e a divisão racional do trabalho. O sistema nasceu para ser a materialização da racionalidade. Porém, pelas mãos dos burocratas, converteu-se em um monstro que todos aprendemos a temer e a abominar.
A lista de disfunções e vícios associados à burocracia é longa. A burocracia afirma que, diante dela, todos somos iguais. No entanto, a igualdade de tratamento costuma vir acompanhada pela impessoalidade, pela negligência e pela ineficácia. A burocracia sacraliza as regras, que passam de meios a fins. Entre resolver um problema e seguir uma norma, o burocrata comumente opta por seguir a norma. Lixe-se o cidadão. A burocracia muda apenas lentamente, quando muda. O ambiente pode transformar-se radicalmente, mas a burocracia não se adapta. Tende a tornar-se anacrônica. A burocracia organiza-se como um sistema neutro e justo. Entretanto, a sua complexidade e o seu porte facilitam o nepotismo, os abusos de poder e a corrupção. O resultado é um sistema central em nossas vidas, do qual não conseguimos escapar, mas que costumamos odiar. A burocracia consegue somar a ineficiência ao poder ameaçador, a incompetência dos amanuenses lerdos à manipulação interesseira dos funcionários corruptos.
Dentro do sistema, os burocratas buscam incessantemente a “expansão geográfica e demográfica”. Quadros inchados significam mais gente a coordenar, mais serviço a controlar e mais poder a exercer. Assim, a burocracia combina negligência no serviço ao cidadão com a capacidade de inventar trabalho para si mesma. John Kenneth Galbraith registrou para a posteridade: “A tendência da burocracia é achar objetivo em qualquer atividade que se esteja fazendo”.
Na burocracia pública ou na privada, os burocratas procriam sem parar. Donald Keough, ex-CEO da Coca-Cola e autor de The Ten Commandments for Business Failure, comentou em alusão à própria multinacional: “Tendo despendido os meus primeiros anos no negócio de gado de meu pai, verifiquei que, se colocarmos a mistura certa de machos e fêmeas, acabaremos por obter muito mais animais. As burocracias multiplicam-se do mesmo modo. Eis como funcionam: põe-se um gestor em um lugar e, decorridos dezoito meses, ele tem uma assistente. A assistente torna-se um gestor júnior e o que se observa? Outra assistente. O ritmo continua”.
Nas burocracias, as regras originalmente estabelecidas para garantir clareza e eficiência deixam de ser meios e se transformam em fins. Por sua vez, os burocratas controlam o sistema como se protegessem a própria vida, pois sentem que mudanças podem reduzir seu poder ou sua autoridade. Com o tempo, os burocratas isolam-se em seus castelos, os abusos tornam-se corriqueiros e eventuais mudanças enfrentam barreiras intransponíveis.
Em Pindorama, muitas empresas e órgãos públicos mantêm padrões inaceitáveis de atendimento e de relacionamento com os cidadãos. Do Poder Judiciário às estatais, do sistema de saúde ao sistema de educação, observamos casos gritantes de desperdício de recursos e de desrespeito aos contribuintes. Todos temos histórias de horror para contar. A situação não é diferente em algumas empresas privadas. Além de vitimar os clientes e funcionários, essas organizações também vitimam a si próprias. No embate entre as forças para mudança e os interesses estabelecidos, os últimos continuam vencendo.
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