Se formos ingênuos a ponto de acreditar nas manchetes das revistas de negócios, concluiremos que Carlos Ghosn salvou a Nissan, Lou Gerstner fez o elefante IBM dançar, e Jack Welch levou as ações da General Electric aos céus. Por trás da despudorada adoração, repousa uma premissa: executivos-chefes são peças vitais nas engrenagens corporativas. Sua inspiração e sua transpiração abrem trilhas e levam as empresas ao sucesso. Honras e glórias lhes são devidas.
Tome-se o caso emblemático de Steve Jobs e da Apple. Jobs foi um dos fundadores da icônica organização, em 1976. Uma década e muitos computadores vendidos depois, foi afastado da própria empresa. Retornou nos anos 1990 para comandar uma reviravolta coroada por sucessos com o iMac, o iPod e o iPhone. O turnaround e os novos produtos iluminaram a estrela de Jobs e inflaram sua legião de adoradores. Em 2004, Jobs anunciou um diagnóstico de tumor no pâncreas. Desde então, sua saúde tornou-se tema público, acompanhado de perto pelo mercado financeiro. Anúncios oficiais da empresa, boatos e até mesmo notícias falsas sobre a condição física de Jobs fazem as ações da Apple oscilar, roubando em poucas horas bilhões de dólares do valor da empresa.
Harris Collingwood, em um artigo para o periódico The Atlantic, parte do caso de Jobs para introduzir uma intrigante questão: quanta diferença um executivo-chefe pode realmente fazer? Até a década de 1970, os presidentes de empresas eram figuras apagadas, tecnocratas que eram vistos, e se viam, como peças de uma engrenagem maior. Sua missão era manter, com discrição, a máquina em funcionamento. Porém, a partir do fim dos anos 1970 começaram a surgir celebridades no mundo corporativo. Lee Iacocca, na Chrysler, e Bill Gates, na Microsoft, além dos citados Steve Jobs, Jack Welch, Lou Gerstner e Carlos Ghosn tiveram seus feitos registrados em incontáveis capas de revistas, artigos e livros. Além de beneficiar os próprios executivos, o fenômeno movimentou a indústria editorial, fomentou as atividades das empresas de eventos corporativos e alimentou consultores de recursos humanos, estratégia e gestão da mudança.
Apesar da crescente oferta de fábulas de sucesso, Collingwood observa que a importância do executivo-chefe não é óbvia. As investigações sobre o tema começaram na década de 1930 e seus resultados são polêmicos. Chester Barnard, pioneiro estudioso da vida corporativa, considerava o executivo-chefe como uma força vital, a prover sentido e direção para a empresa, induzindo os liderados a fazer mais do que a simples obrigação profissional. Nem todos os seus pares concordam. Em um estudo empírico publicado em 1972 na revista científica American Sociological Review, Stanley Lieberson e James O’Connor argumentam que a influência do executivo-chefe sobre o desempenho organizacional é relativamente pequena. Os pesquisadores investigaram 167 empresas e constataram que fatores ligados ao ambiente (por exemplo, disponibilidade de capital e grau de estabilidade do mercado) e à organização (como a posição da empresa diante dos concorrentes) têm maior efeito sobre os resultados do que a ação do executivo-chefe.
James March, professor de Stanford e decano do estudo das organizações, afirma que em qualquer organização bem gerenciada os candidatos ao posto de executivo-chefe são tão parecidos em termos de educação, competências e perfil psicológico que a escolha é irrelevante. O que importa é ter alguém no cargo. Arremata March: “É difícil dizer a diferença entre duas lâmpadas; porém, se você retirar todas elas, fica difícil ler no escuro”. Jeffrey Immelt, atual presidente da General Electric, faz coro a March, afirmando, literalmente, que nos anos 1990 qualquer um poderia ter gerenciado bem a GE, até mesmo um pastor alemão!
Mostrando as nuanças do tema, um estudo conduzido por três professores de Harvard – Noam Wasserman, Bharat Anand e Nitin Nohria – concluiu que os executivos-chefes podem fazer mais diferença em algumas indústrias do que em outras. Setores muito regulados ou estáveis dão pouca margem de manobra à ação gerencial. Setores instáveis e competitivos, por outro lado, exigem criatividade, iniciativa e agilidade de seus líderes.
Collingwood fecha seu artigo com uma frase de Jeffrey Pfeffer, um professor de Stanford notório por suas posturas críticas: “Bons líderes podem fazer uma pequena diferença positiva; maus líderes podem fazer uma enorme diferença negativa”. A considerar a conduta de certos líderes pindoramenses, a máxima de Pfeffer vale também ao Sul da Linha do Equador.
http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=4203
sábado, 28 de novembro de 2009
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